Minha mãe, borda-me
o peito com a agulha
mais fina, com fio de seda,
borda-me o peito com flores
e por entre as flores, pássaros
de bico amarelo, pássaros
que comam os bichos
e me tenham sempre bem asseada.
Manda-me estar quieta,
diz-me que não dói
e remata o último
ponto na dobra dos seios
para que o meu marido
mais tarde possa gabar
tanto o direito
como o avesso do teu trabalho.
Cose-me depois a renda
à volta da cintura, como
a dobra do lençol (a renda
antiga que tiraste das cinturas
das avós), cose-a
com ponto miudinho
onde a carne for mais mole,
e deixa que caia até quase
esconder os pelos que começam
um palmo mais abaixo,
medido pela mão de um homem,
quase, para que eu nunca possa
quase, para que eu nunca possa
sentar-me sem fechar
as pernas.
E para a boca, minha mãe,
faz-me longas as cortinas,
com reposteiros para abafar
o ruído, e nos dentes
pendura-me pérolas,
missangas, pedacinhos
de vidro colorido,
- para que não seja
por falta de sorriso
que eu fique por casar.
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