4.11.10

Lisboa no Inverno

Lisboa no Inverno começa em Agosto
Quando os olhos nos doem
Na página do livro que se fez cinzenta
Sem que déssemos por isso

Lisboa no Inverno começa atrás dos prédios
Quando o sol desaparece mais cedo
E desaparece e desaparece e desaparece
Até ao fim da rua
E fica uma sombra morna por baixo das árvores
Uma sombra larga e luminosa
Tão grande como o sol que se pôs.

Esticamo-nos e reviramo-nos no sofá
Ou debruçamo-nos sobre a mesa
Para evitar um acção mais brusca que interrompa a leitura
Como levantarmo-nos para ligar os candeeiros e acender a casa
Só mais um bocadinho, só mais um bocadinho
Como no sono bom, no duche quente
Que eu agora não quero acordar
Não quero este folclore das estações às cotoveladas no mundo
Agora eu, agora eu
A tirar-me deste torpor

Se ainda agora havia dia
Quase até à meia-noite
Um dia de braços abertos
Como um peixe gigante

Acesa, a casa é uma janela amarela quase invisível
Na noite de Agosto em que o Inverno chega à cidade
E se deixa ficar quieto para ninguém perceber
E o sol que se pôs atrás dos prédios se demora ainda
Aberto
Sobre o rio

1 comentário:

Rui Manuel Amaral disse...

Excelente, como sempre.